"Reabilitamos casas, reconstruímos vidas": uma resposta à pobreza habitacional

Em Portugal, cerca de 6% da população vive em situação de pobreza habitacional, uma realidade que afeta milhares de pessoas e que continua a aumentar. Desde 2010, a associação "Just a Change" tem vindo a responder a este problema estrutural ao reabilitar casas e instituições degradadas, devolvendo a segurança e a dignidade a milhares de pessoas em todo o país.
Regina Nunes
Regina Nunes Jornalista
17 dez. 2025, 08:00

Fotografia de grupo da equipa Just a Change onde maioritariamente são jovens
Fotografia: D.R. Just a Change

A pobreza habitacional é um dos problemas estruturais em Portugal e muitos podem ser os fatores que contribuem para essa realidade, como a degradação de edifícios ou os baixos rendimentos das famílias. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), esta realidade diz respeito a contextos em que as habitações não garantem as condições mínimas de segurança, conforto ou dignidade.

Segundo a "Just a Change" estas lacunas podem ser verificadas através de infiltrações graves, risco estrutural, ausência de eletricidade ou água quente, falta de saneamento, telhados e janelas danificadas, humidade extrema ou situações de sobrelotação. De acordo com o Relatório de Impacto de 2024 da instituição, mais de 625 mil pessoas vivem em casas onde faltam necessidades básicas e essenciais para uma vida digna.


Criada em 2010 e com o lema “reabilitamos casas, reconstruímos vidas”, esta associação visa melhorar a qualidade de vida das famílias e instituições mais carenciadas, através da reabilitação de casas em situação de pobreza habitacional, apostando num modelo de voluntariado e em todo o território nacional. 


“O nosso trabalho é com matéria de pobreza habitacional e fazemo-lo com voluntários, porque acreditamos que o voluntariado traz para a casa a alegria, a esperança e a caridade que um simples empreiteiro não faz”, explica Guilherme Fogaça, diretor-executivo da Just a Change.


Apesar da componente voluntária, todas as obras contam com acompanhamento técnico especializado: “Temos sempre um técnico de obra em cada intervenção. A boa vontade ajuda, mas não faz uma canalização ou um telhado bem feito, é preciso garantir qualidade nas partes mais técnicas”, sublinha ao Conta Lá.


A associação defende que a habitação é um princípio essencial na vida das pessoas e que a falta de condições básicas tem um impacto direto em áreas como a saúde, a educação e o acesso ao emprego. “Se a casa não é um porto seguro e é uma fonte de ansiedade, tudo o resto da vida sai desviado. A casa é um dos alicerces da nossa vida”, afirma Guilherme Fogaça, acrescentando que problemas como a humidade ou falta de saneamento básico podem gerar uma “bola de neve” de dificuldades sociais e económicas.


Em entrevista ao Conta Lá, as situações mais frequentes e encontradas pela Just a Change dividem-se, segundo o responsável, em dois grandes grupos: problemas estruturais graves, como telhados que deixam entrar água ou a inexistência de janelas e a falta de salubridade básica: “Encontramos pessoas sem casa de banho, sem acesso a água canalizada ou sem capacidade de aquecer água. As nossas intervenções mais importantes são a reabilitação de telhados e a criação de casas de banho de raiz”.


Os projetos são financiados por municípios, fundações e empresas parceiras nomeadamente de construção, alimentação, pintura, produtos de limpeza ou mobiliário. Já a mão de obra é maioritariamente voluntária, incluindo voluntários internacionais. O processo começa com a sinalização dos casos por entidades locais, como autarquias ou IPSS: “Não andamos a bater de porta em porta, não temos essa capacidade. Trabalhamos com entidades que já estão no terreno e conhecem bem as realidades que precisam de apoio”, esclarece o diretor-executivo.


Ao longo do tempo, a Just a Change já interveio em mais de 40 concelhos, reabilitou mais de 600 habitações e mais de 700 espaços, incluindo instituições sociais, melhorando a vida de mais de 6.600 pessoas. No que respeita aos impactos das intervenções, os mesmos são avaliados por uma entidade externa, entre seis meses e um ano após as obras: “Os resultados são manifestamente positivos, não só ao nível físico, mas também na saúde, autoestima e relação com a comunidade”, refere Guilherme Fogaça.


A associação pretende encerrar o ano com mais de 130 intervenções e tem como meta duplicar esse número até 2030, um objetivo que, atualmente, enfrenta desafios como a falta de técnicos de obra e a necessidade de angariar mais voluntários: “Os voluntários são a peça-chave de todo este puzzle. Já tivemos de cancelar programas por falta de inscrições".


Quando questionado sobre a cobertura do tema na agenda pública, Guilherme Fogaça afirma que a pobreza habitacional continua a ser um problema pouco visível e que muitas vezes é confundido com o acesso à habitação: “Há pessoas que já têm casa, mas vivem em condições indignas, e isso passa facilmente despercebido se ninguém entrar na sua casa”, alerta o responsável.


Como sinalizar um caso?


Qualquer pessoa pode sinalizar uma situação de pobreza habitacional através do site da instituição. A Just a Change analisa os casos, articula com as autoridades locais e procura os apoios necessários para ajudar famílias ou instituições de solidariedade social. A associação apela ainda à participação de voluntários, reiterando que “precisamos de todos” para continuar a reabilitar casas e a reconstruir vidas.