Interior triplica alojamentos locais em dez anos e afirma turismo rural como motor de desenvolvimento

Entre 2015 e 2025, o número de alojamentos locais em sete distritos do interior praticamente triplicou, com crescimentos históricos em Évora e Vila Real. Os dados do Registo Nacional de Estabelecimentos de Alojamento Local mostram um território em plena transformação turística.
João Nogueira
João Nogueira Jornalista
19 dez. 2025, 07:00

Vista panorâmica de alojamento rural no Alto Douro Vinhateiro
Fotografia: Direitos reservados

O Interior de Portugal está a mudar ao nível do turismo e os números confirmam-no. Em apenas uma década, o número de alojamentos locais registados em sete distritos do Interior praticamente triplicou, com alguns territórios a registarem crescimentos de sete e até dez vezes. Os dados do Registo Nacional de Estabelecimentos de Alojamento Local (RNAL) revelam uma transformação estrutural no turismo fora dos grandes centros urbanos, com o alojamento rural a assumir um papel cada vez mais central.

A análise aos distritos de Bragança, Guarda, Viseu, Castelo Branco, Portalegre, Évora e Vila Real mostra um crescimento consistente entre 2015 e 2025, com uma aceleração clara a partir de 2019. Mesmo sem ainda contabilizar a totalidade do mês de dezembro deste ano, todos os territórios apresentam hoje números muito superiores aos registados há dez anos.

Em 2015, o interior tinha uma presença discreta no mapa do alojamento local nacional. Mas o cenário mudou. Bragança e Guarda triplicaram o número de registos e Castelo Branco multiplicou-os por mais de quatro. 

Mas foi em Évora e Vila Real que a mudança foi mais expressiva: o distrito alentejano passou de 24 para 207 registos, enquanto Vila Real saltou de apenas 13 para 155.

 

A viragem começou antes da pandemia

Os dados mostram que a tendência não nasceu com a pandemia, embora esta a tenha reforçado. Já em 2019, muitos destes distritos tinham duplicado, ou mais, o número de registos face a 2015.

Durante este período, por exemplo, Castelo Branco passou de 24 para 77 alojamentos locais, Vila Real multiplicou-se por sete, de 13 para 93, e Évora quase quadruplicou, passando de 24 para 94.

A pandemia acabou por consolidar uma procura que já estava em crescimento: destinos menos massificados, ligados à natureza, ao património e à autenticidade. E a Associação Portuguesa de Turismo em Espaços Rurais e Naturais (APSTERN) confirma mesmo isso em declarações ao Conta Lá: o turismo rural deixou de ser um nicho.

“Existe um elevado crescimento tanto das tipologias de turismo em espaço rural como de alojamentos locais situados em áreas rurais”, afirma a associação. Segundo a APSTERN, o aumento do número de unidades resulta não só da procura turística, mas também da vontade de fixação de população. “A pandemia foi um pico de procura, mas vemos pelos nossos associados que esta se tem mantido positiva.”

A associação destaca ainda o papel dos apoios públicos, nomeadamente programas do Turismo de Portugal ou o “Crescer com o Turismo”, que incentivam projetos sustentáveis e contribuem para a qualificação da oferta.

“O turismo é um motor de coesão social e crescimento económico dos territórios, fundamental sobretudo em locais onde existe necessidade de fixar população residente”, sublinha a associação. 

Ao contrário do que acontece nas grandes cidades, a aposta no interior não está tanto ligada à aquisição especulativa de património, mas sim à recuperação de casas de família ou a mudanças de vida por parte dos proprietários.

Évora lidera crescimento e reforça atratividade

Évora destaca-se como o distrito onde o crescimento foi mais acentuado ao longo da última década. Para o presidente da Câmara Municipal, Carlos Zorrinho, os números refletem um fenómeno mais amplo de dinamização territorial.

“A atividade turística tem um peso significativo aqui na cidade, com crescimento acentuado de todos os indicadores”, sublinha ao Conta Lá. Em 2024, o concelho registou 709 mil dormidas, mais 2,1% do que no ano anterior, e 433 mil hóspedes, um crescimento de 4,8%. “Os números evidenciam que o turismo é uma alavanca do desenvolvimento do território, quer do concelho quer da região.”

Segundo o autarca, a atratividade de Évora assenta no património histórico e cultural, no reconhecimento do centro histórico como Património Mundial da UNESCO, mas também na “hospitalidade e segurança da cidade e da região”. 

A recente designação de Évora como Capital Europeia da Cultura 2027 surge como um novo fator de impulso, já visível no aumento do interesse dos investidores.

Ainda assim, Carlos Zorrinho ressalva que o crescimento da atividade turística tem de ser equilibrado. A estratégia do município passa por articular o turismo urbano e rural com a preservação do território, a inovação económica e o fortalecimento do tecido social, numa lógica de desenvolvimento integrado.

Com unidades maioritariamente pequenas, muitas vezes de gestão familiar, ligadas ao turismo rural, ao agroturismo e a experiências imersivas, o crescimento do alojamento local no interior representa mais do que um aumento da oferta turística. Traduz investimento na reabilitação do património, criação de rendimento local e uma nova vitalidade para territórios historicamente marcados pelo despovoamento.